domingo, 28 de fevereiro de 2010

A Menina e a Mulher

Numa sala escura, iluminada pelos poucos raios de sol que restara do dia, a mulher estava com os olhos maiores do que o normal e olhando para os lados, evitando o que estava a sua frente. Uma mão segurava a outra, na tentativa de esconder o tremor que por ali parecia começar, passando por todo o corpo e como numa explosão até a sua ultima parada, o coração.

Sentada em uma cadeira, que poderia ser confortável em outras situações, mas não naquela, estava ela, dura, em frente a um espelho que por muito tempo havia evitado, tapando-o com lençóis brancos enormes que sempre faziam questão de lembrá-la que estavam ali por uma só causa, o medo do que veria nos traços do seu rosto e o que esse tempo que passara sem se ver, fizera com a menina que já não mais existia.

Mas ela precisava saber.

Sabia desde o principio que esse dia chegaria, se não já o teria quebrado em milhares de pedaços, talvez não o fez porque saberia que nem em uma vida inteira conseguiria limpar os cacos que continuariam espetando seus pés, incomodando.

Tomou ar e foi.

Com os olhos cerrados virou-se para frente determinada e os abriu. Os ombros foram baixando aliviados, a sua expressão era doce mas um tanto preocupada, estava muito diferente.
Depois de um tempo sentada, tentando se acostumar com sua linhas, a mulher foi chegando mais perto com certa curiosidade de descobrir o que tinha perdido todo esse tempo.

Um sorriso lhe escapou do rosto. Era o mesmo sorriso.

Pouco a pouco foi percebendo que não mudara tanto, que o passado não estava só no espelho e sim em cada gesto que ela fazia, no jeito de andar e no acentuado da sua voz. Estava convencida de que não havia traído seu passado, já conseguia encará-lo sem pedir desculpas, pelo contrario, com a voz baixinha lhe dizia:
- Obrigada, obrigada, obrigada...
Já saiam os primeiros raios do dia. Juntou os lençóis, abriu as janelas e o vento frio e úmido da manhã a lembrou da menina, da mulher que agora ela faria questão de sempre ser.


Karla Brito

Um comentário:

Timeless disse...

gostei desse texto... me lembra muito uma certa menina que eu conheci ;D